Caixa entra no ramo de saúde e agita a concorrência de um setor que investe na popularização e pode dobrar de tamanho em cinco anos, para 7% do PIB
Por Milton Gamez e Márcio Kroehn
Durante muitas décadas, a Caixa Econômica Federal atuou como um banco popular de uma nota só: habitação. Movida pelos financiamentos para a compra da casa própria, a Caixa transformou-se nos últimos anos numa organização ambiciosa, com atuação em várias frentes e oferta de produtos para pessoas físicas e jurídicas. Seu último movimento, na segunda-feira 29, foi a decisão de fincar pé no setor de seguro saúde. Em assembleia, os conselheiros da instituição aprovaram a criação de uma seguradora específica para esse fim. Faz sentido?
Quando se olha o potencial de receitas desse mercado, sim. “O mercado de seguros vai superar o bancário em pouco tempo. Lá fora, as seguradoras é que são donas de bancos”, diz Armando Vergílio, ex-presidente da Susep. No caso da saúde, o mercado brasileiro movimentou R$ 63,6 bilhões em 2009, segundo a Agência Nacional de Saúde (ANS).
Em dezembro, 42,8 milhões de brasileiros possuíam planos de saúde e odontológicos. É um fenômeno que se intensificou nos últimos anos, com o aumento do poder aquisitivo da população. Pesquisa do IBGE divulgada na quarta-feira 31 mostrou que 25,9% dos brasileiros possuíam algum plano de saúde em 2008. Cinco anos antes, eram 24,3%. É nesse mercado pujante que Maria Fernanda Ramos Coelho, presidente da Caixa, está de olho.
A executiva ainda não detalhou sua nova estratégia nem o modelo de negócios que pretende adotar. O Banco do Brasil, por exemplo, atua em parceria com as seguradoras privadas, em joint ventures específicas para cada ramo de seguros. A intenção da Caixa, num primeiro momento, é oferecer planos de saúde para os clientes corporativos, segundo a assessoria de imprensa da instituição.
A prioridade continua sendo o seguro de vida, a preços acessíveis para conquistar as classes populares. Não será fácil para a Caixa ganhar dinheiro com saúde. “Existe uma tendência de concentração das operações de saúde”, afirmou à DINHEIRO o novo presidente-executivo da SulAmérica, Thomaz Cabral de Menezes, cinco horas depois de tomar posse no cargo, na quarta-feira. O número de provedores de planos caiu quase pela metade desde 2000, para 1.200 organizações.
As seguradoras detêm somente 20% das receitas desse mercado, dominado por cooperativas (35%) e empresas de medicina de grupo (30%). Dentre as seguradoras, duas lideram com folga: Bradesco, com participação de 43% em 2009, e Sul América, com 36,7%. Aqui, o nome do jogo é escala.
“O tamanho da carteira é muito importante e faz diferença nas negociações com hospitais e laboratórios”, explica Patrick de Larragoiti Lucas, presidente do conselho de administração da SulAmérica. A companhia, que recentemente comprou a carteira de saúde do HSBC, continua com fome de bola. “Estamos olhando novas aquisições”, diz ele.
Ao contratar um experiente corretor de seguros (Menezes trabalhou na Marsh Corretora por 23 anos), Larragoiti Lucas reforça o canal de vendas independente, do qual depende para fazer frente ao avanço dos grandes conglomerados bancários no setor. “Nos seguros de automóvel e saúde, as vendas são mais técnicas e o uso dos corretores é uma vantagem competitiva”, ressalta.
O empresário, ao deixar de acumular as duas principais funções da SulAmérica, melhorou a governança corporativa, essencial para atrair recursos numa companhia de capital aberto. Se depender das projeções otimistas de crescimento do setor, cada centavo será importante para os investimentos que definirão os ganhadores dos próximos anos.
Somente em 2010, o crescimento do setor deverá ser de 16% a 20%, segundo as projeções Susep, autarquia que regula e fiscaliza empresas de seguros (exceto saúde), previdência aberta e capitalização. No ano passado, as receitas totais dessas companhias aumentaram 12%, para R$ 95 bilhões, e atingiram 3,16% do PIB, um recorde histórico.
Armando Vergílio, que dirigiu a Susep até o mês passado, prevê o dobro disso em pouco tempo. “Se não fizermos nada, o seguro vai a 6% do PIB em 10 ou 12 anos. Pelas ações estruturadas ou planejadas para curto e médio prazo, chega a 7% em cinco anos”, afirma.
O fortalecimento do setor, com a capitalização obrigatória das empresas a partir de 2008, é um dos fatores importantes nesse cenário. Segundo Vergílio, os aumentos de até R$ 30 bilhões em capital ajudaram as companhias a atravessar incólumes a crise deflagrada pela quebra da maior seguradora do mundo, a AIG, nos Estados Unidos, em setembro daquele ano. “Hoje não temos mais seguradoras ameaçadas de quebrar. Isso chegou a preocupar o governo”, revelou Vergílio à DINHEIRO.
A AIG era associada ao Unibanco e não corria risco local, mas o nervosismo dos mercados apressou a fusão com o Itaú, que estava sendo negociada. “O risco de imagem é tão forte que precipitou a fusão. Isso foi rapidamente equacionado. A associação do Itaú Unibanco com a Porto Seguro em automóveis fortaleceu ainda mais a atuação deles”, diz Vergílio.
Quando for aprovado pelo Ministério da Fazenda, o projeto do microsseguro, com apólices específicas para o público de baixa renda, poderá incluir mais 80 milhões de consumidores no mercado, prevê o ex-superintendente. Enquanto isso não acontece, as companhias têm investido em pacotes mais baratos de proteção de pessoas e bens.
As apólices para as multidões sguros. As grandes estrelas são os planos odontológicos e de saúde para pequenas e médias empresas. Não foi à toa que a Bradesco associou-se à Odontoprev e, agora, a Caixa decidiu entrar nesse filão.
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